Independente das muitas situações ridículas, cômicas ou constrangedoras pelas quais passamos em nossa militância política, ingenuamente ou não cumprimos nosso papel na construção do projeto petista, até culminar com a eleição de Lula a presidente. No dia da posse, estávamos em Brasília comemorando nossa maior conquista. Orgulhosos, emocionados e cheios de esperança, aguardávamos as prometidas transformações anunciadas nos programas. Entretanto, fomos presenteados com o episódio do “mensalão”, que foi uma punhalada nas costas da militância... e o “companheiro” Lula ainda teve a coragem de dizer que não sabia de nada. Passada uma raiva inicial, vislumbrei o que acontecia de fato: o PT perdeu o “salto alto” de dono da verdade e caiu na vala comum dos partidos, o novo modelo hegemônico revelou seus mocinhos e seus bandidos, como acontece em todo partido político. Com isso, percebi a dose de ingenuidade com que havia mergulhado naquela aventura e senti, pelo quadro atual, que já não tinha muito mais compromisso com aquele projeto. Fui afastando-me aos poucos...
Minha geração, e as que a antecederam, se comprometeram na luta social acreditando em utopias, em Sierras Maestras e nas barricadas do Quartier Latin no maio de 68; para elas, a cor vermelha trazia um sentido ideológico; gerações estas forjadas em leituras quase obrigatórias como “História da Riqueza do Homem” e “As Veias Abertas da América Latina”; cerramos fileiras nas lutas contra a ditadura militar em movimentos como o das “Diretas Já”. Éramos capazes de nos indignarmos. Atualmente as lideranças são formadas a partir de manuais de autoajuda, em que se propala a felicidade individual em detrimento de qualquer sonho coletivo.
Volto rapidamente ao passado. Lés-Sandar, assistindo a mais um comício nosso em praça pública, me chama a atenção: “vocês estão parecendo um bando de crentes pregando na rua aos irmãos, meia dúzia de doidos e um tal de companheiro pra cá, companheira pra lá etc. etc. etc... só tá faltando o amém Jesus no final.” Fiquei meio sem graça, mas tive de concordar. Algo realmente se quebrava. Já há muito afastado das teologias, ia-me agora distanciando também das ideologias. The dream is over, disse John sabiamente. Penso que também fechei este capítulo.