Necessários no sentido de riscar, traçar linhas que podem ser desenhos ou letras compondo uma ideia... ou mesmo os riscos que somos levados a correr durante a vida... Tanto os riscos/traços/letras quanto os riscos/viver/arriscar são necessários para a sobrevivência dos nossos sonhos, nosso ego, e até mesmos dos nossos fantasmas...


quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

A pré-história de Minas Gerais pode diluir-se na fumaça de uma chaminé


Reiteradamente volto ao tema do nosso patrimônio cultural. Sei que não sou uma voz isolada, mas aproveito o blog para ampliar o espaço de discussão deste assunto. Na edição do bimestre novembro-dezembro de 2004 do extinto jornal impresso “Ecos”, publiquei uma matéria sobre o livro “O patrimônio arqueológico da região de Matozinhos – CONHECER PARA PROTEGER, de autoria da arqueóloga e historiadora Alenice Baeta em parceria com o professor André Prous, do Departamento de Sociologia e Antropologia da FAFICH-UFMG, com fotografias de Ézio Rubbioli, espeleólogo do Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas. Sob o título “Um tesouro escondido”, o texto explicava o conteúdo da publicação: uma síntese das pesquisas arqueológicas da região calcária de Lagoa Santa, de Lund a Walter Neves, passando entre outros por Annette Laming-Emperaire, numa linguagem simples e didática, esclarecendo e informando sobre um assunto ainda pouco valorizado pelos órgãos de planejamento do município e praticamente desconhecido do grande público. Enfim, são 132 páginas de uma obra-prima editorial, com cuidadoso projeto gráfico, belas fotografias e excelentes ilustrações, que deveria ser um dos livros de cabeceira de quem se interessa pelo tema.
Além deste, há outros que poderão ajudar a compreender o grande valor da região de Matozinhos para a arqueologia, a paleontologia e a antropologia brasileira e mundial, e a entender a necessidade de proteção e preservação das nossas cavernas e sítios arqueológicos. De fácil leitura, cito estes dois: “Lapa das Boleiras – Um Sítio Paleoíndio do Carste de Lagoa Santa, MG, Brasil, de Astolfo Araújo e Walter Neves; e “O Povo de Luzia – em busca dos primeiros americanos, dos professores e pesquisadores Walter Alves Neves e Luís Beethoven Piló. Quem ainda não leu estes livros, creio que poderá encontrá-los para empréstimo na Biblioteca Pública Municipal Professor João Batista Teixeira, no Palácio da Cultura, em Matozinhos.
Voltando um pouco no tempo, ex-alunos do Colégio Bento Gonçalves, eu e João Pezzini realizamos naquela instituição uma exposição sob o título “As Grutas de Matozinhos – importância e preservação. A data: outubro de 1980, portanto há 33 anos. Num tempo em que a palavra ecologia soava como neologismo e quase ninguém conhecia seu significado, já estávamos discutindo e tornando públicas nossas preocupações com este acervo cultural do município. Além de fotos impressas, ilustrações e quadros explicativos, fizemos a montagem do que à época era chamado de “audiovisual”, ou seja, uma coleção de slides projetados numa determinada sequência acompanhados de sonorização com músicas e textos. Hoje isso poderia ser feito em poucas horas com um powerpoint em qualquer computadorzinho, entretanto, naqueles anos, esse processo era caro, exigia equipamentos sofisticados e laboratórios de imagem e som. Mas, demos nosso recado. O “audiovisual” apresentava fotos dos sítios arqueológicos e seus paineis rupestres com grande preocupação didática e estética, ao mesmo tempo em que pontuava as chaminés de indústrias que calcinavam as pedreiras, numa óbvia alusão ao risco de desaparecimento que aqueles bens patrimoniais corriam. Ao final, o último slide projetava uma sentença, “desenhada” na face de uma pedra qual uma pintura rupestre, que afirmava: “A pré-história de Minas Gerais pode diluir-se na fumaça de uma chaminé”.
Mesmo se retirarmos o tom dramático da frase, ela ainda continuará sendo válida, o risco ainda pode existir, razão pela qual insistimos na necessidade de aumentarmos o número e o universo de interlocutores. Assim, creio que se deveria dar mais publicidade ao projeto “Terra de Luzia”, do Colégio Bento Gonçalves, ampliar suas informações para além do âmbito exclusivamente escolar, buscando atingir de forma didática toda a comunidade. Também acho interessante socializar, através dos meios de comunicação, as ações e propósitos do Ecomuseu do Carste, para que toda a sociedade o conheça, acompanhe e legitime seu trabalho. Ao mesmo tempo, o poder público municipal, legislativo, judiciário e executivo, através de suas autoridades, precisa ter ciência do potencial de desenvolvimento deste setor, principalmente com as oportunidades que se anunciam como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, e somar esforços no sentido de pressionar o governo estadual na implantação do Parque Estadual de Cerca Grande.
Este é um passo fundamental para que Matozinhos faça parte da chamada “Rota Lund”, programa turístico mineiro dentro do Circuito das Grutas, e possa garantir a preservação daquele sítio arqueológico, além de promover o desenvolvimento turístico municipal de forma sustentável.
A propósito de sítios arqueológicos, João Pezzini me falou a respeito de um projeto de pesquisa arqueológica nas ruínas da fazenda Bom Jardim, que pertenceu à sua família e hoje é propriedade da Lafarge. Mas, este assunto fica para uma próxima postagem.