Necessários no sentido de riscar, traçar linhas que podem ser desenhos ou letras compondo uma ideia... ou mesmo os riscos que somos levados a correr durante a vida... Tanto os riscos/traços/letras quanto os riscos/viver/arriscar são necessários para a sobrevivência dos nossos sonhos, nosso ego, e até mesmos dos nossos fantasmas...


segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Jubileu do Bom Jesus, nossa festa maior


Não posso dizer que sou um tradicional frequentador da festa do Jubileu, mesmo porque multidões não me agradam muito, principalmente agora que já passei dos sessenta anos. Mas, por várias oportunidades participei de equipes de trabalho que organizaram e coordenaram essa festa, que é a mais importante no calendário do município. Alguma coisa a respeito eu conheço razoavelmente.
O Jubileu do Senhor Bom Jesus é a expressão maior da nossa identidade cultural, o mais fidedigno traço de nossas origens portuguesas, essa brava gente que aqui chegou em busca da riqueza do ouro, trazendo em seus alforges muita coragem, esperança e acima de tudo uma fé inquebrantável no Senhor de Matosinhos. E assim, trouxeram também a festa do Jubileu, com sua base religiosa, mas com seus aspectos profanos, que acontecem em todas as festas de Jubileu que se tem notícia. Assim ela é há duzentos anos, creio que assim sempre será.
A festa em Portugal, onde surgiu a lenda do Senhor de Matosinhos, ocorre no mês de maio e “é, há já muitos séculos, indiscutivelmente uma das maiores e mais importantes manifestações da cultura popular do EntreDouroeMinho. Uma das mais famosas e concorridas romarias do Norte de Portugal: as festas do Senhor de Matosinhos, que agora se iniciam, e que, nos nossos dias, fazem passar pela Festa perto de um milhão de pessoas. Tratase de um grande acontecimento sacro mas, igualmente, de inegável impacto profano, com uma programação alicerçada em fortíssimos apelos lúdicos, culturais, gastronômicos e comerciais” (documento de apresentação da imagem do Bom Jesus, restaurada em 2012).



Por todos os anos que presenciei (e participei) da festa e de sua organização, vale o dito popular que sentencia: “de boa intenção o inferno está cheio”. E não estou criticando nenhum aspecto específico do evento neste ano, pois, apesar de morar no “olho do furacão”, não vi nenhum problema que em outros anos não tenha acontecido, algumas coisas até merecem elogios. A questão básica é que não se leva o Jubileu a sério, não há planejamento de longo prazo, não há profissionalização do evento. Há muito tempo, as várias administrações não dão a mínima importância ao setor de turismo municipal; na verdade, quase ninguém acredita em turismo aqui em Matozinhos. Ou seja, entra ano, sai ano e, infelizmente, continuamos improvisando amadoristicamente o que poderia ser a festa cartão-postal da nossa cidade.



A importância do Jubileu no âmbito da cultura popular é reconhecido oficialmente pelo seu registro como Patrimônio de Natureza Imaterial, indicado no Inventário de Proteção do Acervo Cultural – IPAC do município. Este documento caracteriza-o como “a festa mais tradicional e mais representativa do município”. Em outras palavras, a comunidade, através do seu Conselho Municipal do Patrimônio Cultural, reconhece o Jubileu como um dos seus maiores patrimônios imateriais, e este é o primeiro passo para seu “tombamento”. Falta esse reconhecimento por parte das administrações municipais. E constituirá um marco histórico a administração que, de fato, ousar investir de verdade e dar tratamento profissional ao nosso maior evento religioso e cultural.



E para quem ainda não conhece, a seguir reporto a lenda que deu origem a tudo isso.

A lenda do Senhor de Matosinhos
Nicodemos, fariseu convertido, testemunha do drama do Calvário e que juntamente com José de Arimateia despregou o corpo de Cristo da cruz, teria esculpido diversas imagens do Cristo Crucificado, impressionado com os acontecimentos que presenciou. E, por causa das perseguições dos judeus e romanos, o próprio escultor lançou as imagens ao mar, na Palestina, para salvá-las da profanação. Assim, ao sabor das correntes marítimas, uma delas atravessa todo o Mediterrâneo e chega ao oceano Atlântico, indo dar à costa norte de Portugal, na praia do Espinheiro, hoje praia de Matosinhos. Era o dia 03 de maio do ano 124, segundo século de nossa era, domingo do Espírito Santo ou de Pentecostes.
Recolhida a imagem pela população, constatou-se a ausência de um dos braços. Foi levada então para o Mosteiro de Bouças, e realizadas inúmeras tentativas para substituição do membro perdido, mas sem lograr êxito. Cinquenta anos depois, no ano de 174, nesta mesma região uma mulher que procurava lenha encontra uma peça de madeira e a leva para casa. Ao tentar queimá-la, a peça se afastava do fogo reiteradas vezes, até que a filha desta senhora lhe diz: “esta madeira é o braço que falta à imagem do Senhor Bom Jesus de Bouças”. O detalhe é que a filha era, até então, muda. Assim, o braço foi levado ao convento de Bouças e reintegrado com perfeição à escultura original do Cristo, e a notícia daquele primeiro milagre se espalhou, inicialmente em Portugal, e posteriormente por toda a península ibérica. É desde este milagre que data a grande romaria ao Espírito Santo de Matosinhos.
Inicialmente guardada no Mosteiro de Bouças, a imagem foi transferida no século XVI para a igreja de Matosinhos e é considerada a mais antiga imagem, em tamanho natural, do Cristo Crucificado existente em Portugal. Esta fama cruzou o Atlântico e deu origem no Brasil a mais de 30 igrejas dedicadas ao Senhor de Matosinhos. Edgard de Cerqueira Falcão, em A Basílica Senhor Bom Jesus de Congonhas do Campo (Brasiliensia Documenta, 1962), fala dos imigrantes que vieram para o Brasil durante o século XVIII com vistas nos garimpos de ouro das Gerais e da fé que os acompanhava: Por tal forma, implantou-se entre as alterosas montanhas da Serra do Espinhaço e adjacências, ardente culto ao Bom Jesus de Matosinhos, glorioso patrono, sobretudo, das populações setentrionais da metrópole lusa." Dessa forma, nossa cidade recebeu a autorização episcopal, em 30 de maio de 1774, para a construção da capela, que foi erguida por Inácio Pires de Miranda, filial da Matriz de Roça Grande (Sabará). Em 1920, o templo primitivo foi demolido e, em 1921, iniciou-se a construção da atual igreja Matriz do Senhor Bom Jesus de Matozinhos.

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