Necessários no sentido de riscar, traçar linhas que podem ser desenhos ou letras compondo uma ideia... ou mesmo os riscos que somos levados a correr durante a vida... Tanto os riscos/traços/letras quanto os riscos/viver/arriscar são necessários para a sobrevivência dos nossos sonhos, nosso ego, e até mesmos dos nossos fantasmas...


sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A propósito de “uma noite em 67”


Recentemente, recebi de um amigo um e-mail recomendando assistir ao documentário “Uma Noite em 67”, dirigido por Renato Terra e Ricardo Calil no ano de 2010. A partir de imagens de arquivo da Rede Record e depoimentos de alguns participantes como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil e outros mais, o filme apresenta a final do “3º Festival da Música Popular Brasileira”, era a noite de 21 de outubro de 1967 (coincidentemente, estou escrevendo este comentário em 21 de outubro de 2013, exatos 46 anos após).
Este festival ficou famoso principalmente pelo aparecimento em cena da Tropicália, capitaneada por Caetano e Gil que criaram um contraponto radical apresentando-se acompanhados por bandas de rock (Os Mutantes) e toda sua parafernália eletrônica. Isto era uma heresia, pois aquele se tratava de um festival de MPB. Episódio também famoso foi protagonizado por Sérgio Ricardo, que quebrou uma viola no palco e a arremessou para a platéia quando foi vaiado durante a (tentativa de) apresentação da sua música “Beto Bom de Bola”.

 
Vencido por Edu Lobo, que interpretou a canção “Ponteio” com a cantora Marília Medalha, este Festival foi um marco importante na música brasileira, quando despontaram nomes que se tornaram grandes ídolos musicais até hoje, e ocorreu em um tempo de ditadura militar e radicalismos maniqueístas de toda ordem. Vale a pena acessar o documentário no YouTube e rever (para quem for da minha geração e acompanhou ao vivo) ou conhecer as cenas, algumas até muito curiosas de bastidores e suas entrevistas.
Feito o convite, vamos ao segundo ponto. Após asssistir ao filme, tive a curiosidade de ler alguns comentários no site do YouTube. Aí começou minha indignação, pois a gente constata imediatamente, e mais uma vez, a grande banalização da violência. Na rua, a facilidade com que se mata, e pelos motivos mais fúteis, é veiculada toda noite nos jornais da TV, mas a gente sempre tem a esperança de que em um espaço para reflexão intelectual (pelo menos espera-se que este seja – um documentário cultural veiculado no YouTube), a argumentação tenha bases bem fundadas e a linguagem seja, no mínimo, respeitosa, visto que nem sempre se conhece as pessoas com quem dialogamos online. Triste e ingênua esperança. Sem querer aprofundar, reproduzo dois rápidos exemplos (partes do texto) dessa agressividade gratuita e argumentação puramente emocional; também omito os nomes dos autores, mesmo porque um deles utiliza pseudônimo e outro usa o desenho de focinho de um animal no lugar da foto de seu rosto.
O primeiro se expressa assim: “Q BOM PRA VC Q GOSTA DE TUDO, PRA MIM ISSO SE CHAMA FALTA DE PERSONALIDADE, TODOS TEM O DIREITO SIM DE GOSTAR ´´A´´ E NAO GOSTAR DE ´´B´´ E SE MANIFESTAR. MINHA CRITICA NAO FOI PARA QUEM OUVI OU ASSISTI OU LE, CADA UM ALIMENTA SEU CEREBRO COMO QUISER, MINHA CRITICA FOI EM CIMA DE FATOS Q ´´EU´´ VEJO, ESCUTO E ASSISTO, E VEJO Q HOJE O Q E ´´BOM´´ E FUTIL, VAZIO, VULGAR E DESCARTAVEL. AO CONTRARIO DE VC, EU NAO SOU UFANISTA E NAO GOSTO DESTA MAIORIA DE LIXO FABRICADO PELA MIDIA PRA VENDER!!!” (sic). Uma verborragia apressada e em letras maiúsculas (imagino que assim ele pensa que vai assustar alguém ou parecer que está gritando), com abreviações do “internetês” que, no final, mascaram um texto arrogante, pois faz afirmações sem um bom arrazoado, e é nitidamente mal escrito.
Mais adiante, um outro internauta explode imprecações de uma agressividade como ainda não tinha visto neste espaço cibernético: “...além do mais o compromisso do artista é com seu público e não com ideologias vagabundas de terceiro mundo. Além de tudo tú é burro. Pra eu descer a lenha em imbecís como vc eu não preciso elogiar. È só descer. Pra mim quem admira CANALHAS, CANALHA É!!” (sic). Este dispensa comentários...
E não precisamos ir muito longe para encontrar a dupla agressividade gratuita e argumentação emocional. O tão e quase sempre simpático facebook está recheado de exemplos de pessoas (algumas até conhecidas) que exprimem suas opiniões de forma não muito elogiosa quando se referem principalmente aos representantes do povo estabelecidos no executivo ou no legislativo. Parece que com o judiciário há um certo respeito (ou temor mesmo). Outro dia, li no facebook o comentário de um morador da nossa cidade referindo-se aos funcionários da prefeitura de Matozinhos como os “muares”. Não conheço o cidadão, não sei de suas façanhas e valentias, mas fiquei pensando se, cara a cara, ele seria tão “criativo” e corajoso. Vai que seu desafeto seja mais pesado que ele e não goste de levar desaforo pra casa... Aí, há o risco de o ofendido sapecar-lhe um belo e sonoro sopapo ao pé do ouvido. Nesse momento, nenhum facebook, youtube, google, orkut, gmail ou coisa do gênero vai protegê-lo.
Infelizmente, há muitas pessoas que ainda se escondem sob pseudônimos ou mascaram seus rostos em caricaturas para se sentirem livres e protegidas para desancar seus adversários, inimigos ou quem quer seja, sem o risco de serem também agredidos. A esta atitude dá-se o nome de covardia. E o curioso é que este fenômeno é bem uma característica do momento que vivemos, propiciado pelo avanço tecnológico, pela democratização do ciberespaço, pela ampliação das redes sociais. E as redes sociais são de todos, inclusive dos covardes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário